Blogueiros americanos celebram a gordura

Big Fat DealHá anos, os especialistas em saúde vêm alertando que os norte-americanos são gordos demais, se exercitam de menos ou comem demais, e que nossa saúde está em risco. Alguns gordos discordam.

Blogs escritos por pessoas gordas -e usar o termo é completamente aceitável, segundo eles- se multiplicaram nos últimos meses, criando uma espécie de fórum virtual conhecido como “gordosfera”, no qual os blogueiros que lutam pela aceitação da obesidade contrariam praticamente tudo que o conhecimento médico tradicional tem a dizer sobre o assunto.

Inteligentes, divertidos e irreverentes, blogs que usam títulos como “Big Fat Deal”, “FatChicksRule” e “Fatgrrrl!” (“agora com 50% mais gordura!) contrariam o sentimento de oposição à obesidade. Os autores celebram suas figuras roliças e conclamam os leitores a aceitar os próprios corpos, deixar a dieta de lado e tocar a vida.

A mensagem da gordosfera não é simplesmente a de que não há nada de errado em ser gordo. Muitos dos autores de blogs descartam a “epidemia de obesidade” como uma histeria. Argumentam que os norte-americanos atuais não são muito mais gordos que os do passado, e que ser gordo não é, por si só, prejudicial a qualquer pessoa.

E eles rejeitam uma crença muito importante para muitos norte-americanos, entre os quais muitos obesos: a de que tudo que uma pessoa gorda precisa fazer para se tornar magra é comer menos e fazer mais exercício.

“Um dos primeiros obstáculos à aceitação da gordura é superar a questão de que a gordura é uma escolha”, diz Kate Harding, autora do blog Shapely Prose, em entrevista. “Nenhum proponente da aceitação dos gordos diz que a pessoa deve comer sem nenhum controle. O que dizemos é que dieta e exercícios não tornam todo mundo magro”.

Harding, 33 anos, uma entusiasta da ioga que vive em Chicago, promove a idéia de que se pode ser saudável não importa o tamanho (o dela é 44). Harding criou o blog (www.kateharding.net/) em abril, depois de perceber que os postos sobre gordura em seu blog pessoal atraíram interesse. Desde então, o site se tornou um dos mais populares blogs do movimento pela aceitação da gordura, com uma média de 3.710 visitas diárias, de acordo com o programa de aferição de audiência Sitemeter.

As pessoas têm tamanhos e formas diferentes, alegam blogueiros como Harding, e, para quem nasce extragrande, dietas não adiantam. Muitos dos blogueiros classificam seus sites como “zonas de dieta proibida” (e nem pense em mencionar cirurgias para redução de peso).

“Você termina abandonando a dieta, e depois recomeça, e dessa vez realmente vai mantê-la até o fim”, diz Marianne Kirby, 30 anos, de Orlando, Flórida, a responsável pelo blog The Rotund (www.therotund.com). “E mesmo assim não funciona, em longo prazo -você termina ainda mais gordo. E fica se perguntando por que caiu nessa história uma vez mais”.

Os blogs atraíram algumas respostas negativas, e até cruéis. Mas para os leitores obesos, as mensagens que eles oferecem são libertadoras. “Amiga, vou lhe dizer: enfim estou me aceitando como sou”, comentou uma fã no site de Harding. “Serei sempre gorda. Aceito isso agora”.

Harriet Brown, 49 anos, colaboradora ocasional do New York Times, vive em Wisconsin e é autora de um blog (www.harrietbrown.com) no qual encoraja os leitores a aderir à sua promessa de “eu amo meu corpo”, sob a qual eles se comprometem a não fazer comentários negativos sobre suas coxas ou barrigas, e a não se definirem com termos do tipo “gordo como um porco”.

O blog Fat Fu (www.fatfu.wordpress.com), cujo autor não revela o nome, desmonta de maneira impiedosa recentes pesquisas como o estudo “amigos gordos”, e oferece uma das mais abrangentes listas de links para a gordosfera, incluindo comunidades online e sites de moda e saúde para gordos. O blog Big Fat Deal (http:/ww.w.bfdblog.com) sugere 10 maneiras para que a pessoa se torne um “ativista positivo” do corpo, entre as quais “seja você mesmo”, “compreenda que há muitos idiotas odientos no mundo” e “não tenha medo de pedir o doce”.

Muitos dos blogs são escritos por mulheres cujos textos oferecem um tom pronunciado de feminismo, mas existem autores homens no movimento pela aceitação da gordura, como o do blog Red No. 3 (www.red3.blogspot.com), segundo o qual “olha, eu não vejo problema em ser gordo. Meu corpo conta com um adorno a mais, e aceito isso”.

Mas alguns especialistas consideram que esse tipo de mensagem é perigosa e pode solapar os esforços de saúde pública para conter a obesidade. “Precisamos tomar cuidado em não culpar apenas o indivíduo”, diz o Dr. Walter C. Willett, professor de nutrição e epidemiologia na Escola de Saúde Pública de Harvard. Mas ele acrescenta que “a imensa maioria das pessoas que sofrem de excesso de peso enfrentam essa situação devido ao seu estilo de vida”.

Os blogueiros argumentam que mudanças nas definições adotadas ao longo do tempo, além de falhas no cálculo do índice de massa corpórea, empurraram mais pessoas às categorias “gordo” e “obeso”, nos Estados Unidos, e apontam para estudos divergentes segundo os quais o excesso de peso pode ser benéfico, entre os quais um grande estudo que constatou que os norte-americanos que estão abaixo do peso padrão têm chance de morte superior à das pessoas moderadamente acima do peso.

Diversos outros estudos recentes sobre pacientes cardíacos e de hemodiálise demonstraram, igualmente, índices de sobrevivência mais elevados para os pacientes mais pesados, o que sugere que o vínculo entre as dimensões do corpo e a saúde pode ser mais complexo do que normalmente definimos. Outro estudo, sobre pessoas com mais de 60 anos de idade, constatou que estar em forma influenciava mais a longevidade do que simplesmente estar magro.

A principal alegação dos blogs é que ser gordo não é resultado de uma falha moral ou de caráter, ou de gulodice, preguiça ou falta de força de vontade. As dietas muitas vezes têm efeito contrário ao pretendido, eles alegam; de fato, numerosos estudos de longo prazo demonstraram que ainda que as pessoas em dieta sejam capazes de perder peso em curto prazo, quase sempre o acumulam de novo nos anos seguintes.

Em última análise, os blogs argumentam, ser magro pode ter muito mais relação com sorte genética do que com escolhas relativas ao estilo de vida.

“Aceitamos que algumas pessoas são baixas e outras são altas”, disse Rachel Richardson, 28 anos, de Cincinatti, autora do blog F-Word (www.the-f-word.org). “Mas parecemos considerar que todas as pessoas deveriam ser magras. Isso não faz sentido”.

Os blogs que promovem a aceitação da gordura alegam que a guerra contra a obesidade deu às pessoas uma desculpa para que promovam uma guerra contra os gordos, e que preocupações de saúde -associadas à crença de que os gordos são culpados por sua obesidade- estão sendo usadas para justificar discriminação que não seria tolerada com relação a qualquer outro grupo de pessoas.

“Não me surpreende que existam tantos blogs como esses”, disse Richardson. “A histeria quanto à obesidade chegou ao ponto de ebulição. Os blogs são uma maneira de combatê-la”.

Tradução: Paulo Migliacci ME

The New York Times

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Ter saúde é o que importa. O que não está certo é comprometer a saúde em decorrência do excesso de peso (assim como a falta dele tb).

Isa

Um comentário sobre “Blogueiros americanos celebram a gordura”

  1. Oi! Estava passeando pela Blogosfera Ligth e encontrei seu blog. Gostei muito, que loucura isso sobre a “aceitação” dos gordos…a questão está acima disso, obesidade é doença e como tal deve ser tratada. Tenho um blog sobre atividade física, emagrecimento e saúde, venha me fazer uma visita também e aproveite as dicas.
    Um abraço
    Denise

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